sexta-feira, 31 de outubro de 2025

Springsteen: Salve-me do Desconhecido

 


Título no Brasil: Springsteen: Salve-me do Desconhecido

Título Original: Springsteen: Deliver Me From Nowhere

Ano: 2025

País : EUA

Direção: Scott Cooper

Roteiro: Scott Cooper

Elenco: Jeremy Allen WhiteJeremy StrongPaul Walter Hauser

Nota: 2,5/5.0

Por Amanda Gomes

As cinebiografias musicais parecem ter se transformado em um gênero próprio dentro de Hollywood. Existe uma tendência cada vez mais evidente de transformar artistas em produtos de prateleira, embalados com cortes bem-feitos, figurinos meticulosamente envelhecidos e aquele velho arco narrativo de ascensão, queda e redenção. É o “modo automático” de se contar histórias reais: brilho na superfície, vazio no conteúdo. “Springsteen: Salve-Me do Desconhecido”, dirigido por Scott Cooper, se encaixa dolorosamente bem nessa lógica e talvez até a resuma.

O filme tenta recontar o processo de criação de Nebraska (1982), álbum mais introspectivo de Bruce Springsteen, nascido em meio à solidão, à depressão e à auto análise de um artista tentando compreender o próprio vazio. E o mais frustrante é que o material original, tanto biográfico quanto simbólico, tinha tudo para ser fascinante. Mas o que chega às telas não é bem isso.

Jeremy Allen White entrega uma boa performance, com intensidade, mas seu talento acaba preso dentro de uma estrutura previsível demais para permitir qualquer transcendência. Ele reproduz os trejeitos, o olhar distante e até a postura corporal de Bruce, mas o roteiro parece preocupado demais em fazer dele um “Oscar moment” ambulante. Odessa Young, como Faye Romano, uma personagem inventada e composta a partir de várias mulheres da vida real de Bruce, é um dos poucos respiros emocionais do filme. Mas mesmo ela parece existir apenas para preencher lacunas narrativas.

Há algo curioso e incômodo nessa padronização das cinebiografias recentes: quanto mais famosas as figuras retratadas, menos autoral o cinema se torna. “Springsteen: Salve-Me do Desconhecido” poderia ter sido escrito por uma inteligência artificial. Tudo é tão “certinho”, tão planejado para não ofender nem desafiar ninguém, que o filme parece um clipe institucional da própria indústria que Springsteen tantas vezes criticou em suas letras. O olhar político e contestador do “Boss” simplesmente desaparece.

Há beleza, sim, mas uma beleza de superfície, como se o diretor quisesse capturar a alma de Springsteen por meio de filtros de Instagram. O resultado é um cinema que confunde “introspecção” com lentidão e “profundidade” com melancolia bem fotografada.

E ainda assim, algo pulsa. É possível sentir, em meio à automatização estética e ao roteiro previsível, lampejos do que poderia ter sido: quando o filme se permite escutar o silêncio, olhar a estrada vazia e deixar Bruce existir fora do palco, algo se aproxima da honestidade que o músico sempre cultivou. Nesses instantes, Salve-Me do Desconhecido quase consegue escapar do molde e tocar no real. Quase.

No fim, o longa não é um desastre, mas tampouco é o retrato de um artista. É uma réplica de luxo: bonita, funcional e vazia. O que falta é o sentimento de paixão.


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